Paulo Marcelo Serrano se dedica a cinco atividades profissionais após aposentadoria

 


“Não me aposentei. Eu mudei de atividade.” Esta é a sensação do desembargador Paulo Marcelo Serrano, que deixou a Justiça do Trabalho após 25 anos. Atualmente, ele se divide entre cinco atividades, a maioria delas de consultoria.

Em entrevista ao site da AMATRA1, Paulo Marcelo falou sobre a vida após a aposentadoria, lembrou a trajetória na magistratura, os desafios, a importância da vida associativa e analisou as mudanças da Justiça do Trabalho. Aprovado em 7º lugar no primeiro concurso público que prestou, em 1992, Paulo Marcelo tomou posse no ano seguinte. Em 1994 foi promovido à titularidade. Chegou a desembargador em 2012 e atuou como convocado no TST (Tribunal Superior do Trabalho) a partir de 2006.

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Serrano se dedica agora ao trabalho de consultor nos Conselhos de Administração do BNDES, BNDESPAR e Finame, nos escritórios Barreto Advogados e Almeida Serrano Advocacia, e na ONG (Organização Não-Governamental) Afro-Reggae (pro-bono), além de lecionar na PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro).

A aposentadoria veio a partir da insistência dos filhos, que moram no exterior. Paulo Marcelo conta que chegou a cogitar concorrer a uma vaga no TST (Tribunal Superior do Trabalho), mas decidiu acatar o pedido da família.

“Meus filhos sempre me cobraram a aposentadoria no primeiro momento que fosse possível. Eu contava em 2016 que haveria uma Reforma da Previdência. Fiz os cálculos e teria que cumprir mais um pedágio de cerca de dois anos. Só que não houve Reforma da Previdência. E em dezembro eu cumpri os requisitos. Me reuni com os filhos no fim do ano e fui cobrado neste sentido. Refleti com eles e cheguei à conclusão que devia honrar com aquilo que eu tinha me comprometido com eles.”

A aposentadoria da magistratura veio em 19 de abril, mas a vida profissional ganhou outros rumos. A atividade de consultor consome boa parte do tempo de Paulo Marcelo. Ele conta que os filhos não ficaram completamente satisfeitos, mas aceitaram a decisão de continuar a vida profissional.

“Eles ficaram um pouco decepcionados. Eu tinha programado passar um mês com eles entre julho e agosto. Já tinha comprado passagem e tudo. Por causa destas atividades tive que reduzir para 12 dias. Mas eles entendem. Acham que aposentadoria já foi um ganho porque é mais fácil abrir um espaço quando precisar.”

Engenheiro antes de magistrado

Formado em Engenharia e Arquitetura pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), em 1981, o Direito entrou na vida de Paulo Marcelo quando ele já atuava no ramo imobiliário. Chegou a trabalhar no antigo BNH (Banco Nacional da Habitação). Em 1987, formou-se em Direito pela Universidade Cândido Mendes.

O interesse pela magistratura foi despertado por um colega do BNH, Marco Antônio Cavalcante de Souza, juiz do Trabalho aposentado e, atualmente, juiz de Direito. Paulo Marcelo conta que ingressou na área trabalhista, pois foi o primeiro concurso que abriu, além de gostar de atuar na Justiça do Trabalho por conta do alcance social.

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“Sempre me despertou um gosto muito grande o fato de o magistrado trabalhista ter a seu dispor um instrumental muito diversificado para efetivamente entregar a prestação jurisdicional a quem tenha direito. As soluções das demandas trabalhista em todos os graus se dão de forma muito mais célere.”

Paulo Marcelo ingressou na magistratura na 13ª Junta de Conciliação e Julgamento, antiga nomeação das atuais varas do Trabalho. Na ocasião, o titular, Gerson Conde, estava convocado pelo TRT-1 (Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região). Quem comandava a junta era o juiz substituto Galba José dos Santos, logo promovido à titularidade na 24ª Junta. Assim, Paulo Marcelo assumiu a presidência da 13ª Junta.

Sacrifícios no início da carreira

O desembargador aposentado lembra as dificuldades do início de carreira. Com até 5 mil processos por ano, os prazos eram longínquos e as audiências fracionadas. Ele conta que se impôs um limite de seis meses.

“Eu não tinha coragem de dizer para as partes que a próxima audiência estava sendo marcada para 1 ano e meio depois.”

Com tamanho volume de trabalho, pelo menos uma das férias era destinada a colocar o trabalho em dia. “Foi um período de muita dedicação e esforço. E de muito prejuízo familiar. Minha filha caçula nasceu neste período. Depois que eu fui perceber que praticamente não tenho fotos com ela no período, porque eu saía de manhã e ela estava dormindo. Quando voltava à noite, ela já estava dormindo. Final de semana, minha esposa saía com ela para eu poder fazer as sentenças. Mas deve ficar registrado que não foi um sacrifício apenas meu. Ouso dizer que era um sacrifício comum entre os colegas.”

Além das precárias condições de trabalho, os desafios da magistratura ainda incluíam a baixa remuneração, o que levou Paulo Marcelo a cogitar pedir exoneração nos anos 90. Ele conta que um dos objetivos ao alcançar a promoção para desembargador era colaborar com a abertura do TRT-1 às opiniões dos juízes de 1º grau e melhorar as condições de trabalho.

“Se hoje a magistratura goza de meios mais adequados ao exercício da sua atividade, isto, evidentemente, não é nenhum favor. É o mínimo que se pode oferecer para um juiz que exerce uma atividade extremamente penosa. Os juízes hoje enfrentam desafios de outra natureza. As demandas são mais complexas e a própria competência da Justiça do Trabalho se alargou bastante com a Emenda Constitucional 45.”

Futuro desafiador para Justiça do Trabalho

Apesar das melhorias na remuneração e nas condições de trabalho na magistratura nas últimas duas décadas, o desembargador aposentado vislumbra um futuro ainda desafiador para a Justiça do Trabalho. A Reforma Trabalhista, contestações em relação aos subsídios e propostas de extinção da magistratura do Trabalho despertam preocupação em Paulo Marcelo.

“O que vem acontecendo também é a ‘juvenilização’ da magistratura. É um problema ter magistrados de 25 anos porque são pessoas que tiveram pouca experiência de vida para lidar com as lides que vão decidir. Magistrados de outros países entram na carreira com mais vivência e também com algum interesse financeiro na carreira. Hoje em dia, o que ganha um juiz substituto interessa muito mais a alguém recém-formado do que a um profissional com mais de dez anos de carreira.”

Ele acrescenta, porém, que os magistrados mais jovens apresentam todas as condições de saber jurídico para exercício da função e que, quanto à pouca vivência, o tempo se encarregará de resolver. Outro desafio para a Justiça do Trabalho, na avaliação do desembargador aposentado, é a Reforma Trabalhista. Ele acredita que a falta de debate levou à aprovação de uma lei que trouxe insegurança jurídica, com diversos pontos de constitucionalidade questionável.

“Em muitos aspectos a insegurança ficou maior. Tem pontos que precisavam mesmo ser alterados porque a legislação vai ter que sempre ser alterada, mas é uma injustiça dizer que a legislação trabalhista é a mesma desde a criação da CLT. Já se alterou muito e pode se alterar. Eu acho que, se não fosse com tanta rapidez, talvez pudesse ter tido uma modificação bem mais adequada ao equilíbrio das relações entre empregado e empregador e ao ordenamento jurídico.”

Importância da vida associativa

Paulo Marcelo destacou a importância do associativismo e da AMATRA1. Segundo ele, a associação historicamente contribuiu para a evolução da magistratura e do próprio TRT-1, além de se destacar como importante instituição de defesa dos direitos sociais e trabalhistas. Ele lembra que, com os colegas Claudio Montesso e Alexandre Teixeira, se candidatou à direção da AMATRA1, em 1993, apesar do risco à carreira por serem todos na ocasião juízes substitutos.

“O presidente do TRT-1 na ocasião tinha uma relação muito complicada com os juízes de primeiro grau e em especial com a AMATRA1. Muitos me aconselharam a não ser diretor. Se dizia até que diretores que fossem juízes substitutos não-vitaliciados, como eu e Claudio Montesso, poderiam sofrer represálias. Até brinquei na época: olha, se isto realmente acontecer e eu sair da magistratura, espero que todos vocês me enviem clientes porque vou advogar. De fome eu não vou morrer. Ignoramos qualquer eventual risco neste sentido e concorremos pela importância que todos atribuímos à vida associativa e a AMATRA1”, completou.