04 de agosto de 2021 . 17:26

AMATRA1 apoia carta pedindo mudança da MP que prejudica a aprendizagem

A Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 1ª Região - AMATRA1 apoia a “Carta Aberta aos Parlamentares”, elaborada pelo Fórum Estadual de Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção do Adolescente da Bahia (Fetipa-Bahia). O documento solicita alterações em trechos que impactam a Aprendizagem Profissional, presentes no Projeto de Lei de Conversão da Medida Provisória nº 1.045, de 2021.

O PLV da MP visa instituir o Novo Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, e dispõe de outras medidas complementares para o enfrentamento das consequências da pandemia da Covid-19 no âmbito do trabalho. Recentemente, o texto recebeu dois novos projetos, entre eles o Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtiva – Requip.

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De acordo com a proposta, os jovens em situação de vulnerabilidade ou risco social incluídos no Requip não terão vínculo de emprego com o estabelecimento, direitos trabalhistas e previdenciários, salário e proteção social, mas serão contabilizados para efeito de cumprimento da cota obrigatória de aprendizagem. Já os jovens aprendizes em situação de vulnerabilidade ou risco social são contratados sob a égide da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), por meio de contrato especial de emprego, com direitos trabalhistas e previdenciários assegurados.

A carta ressalta que o texto “é ostensivamente preconceituoso, elitista, excludente e discriminatório, considerando as pessoas em situação de vulnerabilidade ou risco social como uma categoria inferior de pessoas, de quem podem ser retirados os direitos trabalhistas e previdenciários por meio de um programa que incentiva sua contratação precária para a substituição da cota de aprendizes contratados pelas regras celetistas”.

Veja a carta na íntegra:

CARTA ABERTA AOS PARLAMENTARES

O FETIPA - BAHIA FÓRUM ESTUDUAL DE PREVENÇÃO E ERRADICAÇÃO E DO TREABALHO INFANTIL E PROTEÇÃO DO ADOLESCENTE,  através de sua atual

presidente, adiante assinada, dirije-se a Vossas Excelências para solicitar a exclusão ou alteração do Projeto de Lei de Conversão da Medida Provisória nº 1.045, de 2021, em relação à Aprendizagem Profissional - a Medida Provisória (MPV) nº 1.045, de 2021 - que visa instituir o Novo Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e que dispõe sobre medidas complementares para o enfrentamento das consequências da emergência de saúde pública de importância internacional, decorrente do coronavírus (covid-19), no âmbito das relações de trabalho, já levada ao Congresso Nacional para apreciação e conversão em lei, quando teve o seu teor acrescido por diversas Emendas relativas a outros temas trabalhistas, dentre eles a Aprendizagem Profissional, o fazendo pelos motivos adiante aduzidos.

A Medida Provisória (MPV) nº 1.045, de 2021, que institui o Novo Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e dispõe sobre medidas complementares para o enfrentamento das consequências da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19) no âmbito das relações de trabalho, foi levada ao Congresso Nacional para apreciação e conversão em lei, quando teve seu teor acrescido por diversas Emendas relativas a outros temas trabalhistas, dentre eles a Aprendizagem Profissional.

As alterações repentinamente propostas para a Aprendizagem Profissional não podem passar despercebidas pela Sociedade e, principalmente, pelos Parlamentares, que, no afã de aprovarem medidas essenciais para a sobrevivência das empresas e dos empregos, poderão acabar por aprovar alterações que prejudicarão enormemente a Aprendizagem Profissional.

A seguir destacamos os artigos/temas relacionados à Aprendizagem Profissional que devem ser excluídos do Projeto de Lei de Conversão da Medida Provisória (MPV) nº 1.045, de 2021:

Art. 66. O jovem em situação de vulnerabilidade ou risco social incluído no Requip poderá ser contabilizado para efeito de cumprimento da cota obrigatória de aprendizagem, nos termos da Lei nº 10.097, de 19 de dezembro de 2000.

Parágrafo único. Para efeito do disposto no caput deste artigo, são considerados jovens em situação de vulnerabilidade ou risco social:

  • – adolescentes egressos do sistema socioeducativo ou em cumprimento de medidas socioeducativas;



  • – jovens em cumprimento de pena no sistema prisional;



  • – jovens e adolescentes cujas famílias sejam beneficiárias de programas federais de transferência de renda;



  • – jovens e adolescentes em situação de acolhimento institucional; V – jovens e adolescentes egressos do trabalho infantil; e


VI – jovens e adolescentes com deficiência.

O artigo afronta dispositivos de natureza material da Carta Magna, Com a aparente benevolência de ampliar a oferta de oportunidades aos jovens em situação de vulnerabilidade e risco social, cria uma condição de discriminação vexatória ao Estado Brasileiro.

Os Aprendizes que não estão “em situação de vulnerabilidade ou risco social” são empregados, contratados sob a égide da CLT, por meio de contrato especial de emprego, com direitos trabalhistas e previdenciário assegurados, tais como salário e seus reflexos, férias acrescidas de 1/3 ao salário, recolhimento de FGTS e recolhimento da contribuição para o INSS, o que implica direito a auxílio-doença, auxílio-acidente, salário- maternidade, pensão por morte etc. Além disso, os Aprendizes têm direito às garantias provisórias de emprego estabelecidas por lei, como por exemplo a acidentária e a gestacional e a impossibilidade de rescisão antecipada por dispensa sem justa causa. Os Aprendizes têm direito também a serem incluídos em Acordos e Convenções Coletivas de Trabalho e têm assegurado horário especial de trabalho que lhes garanta a frequência à escola.

Enquanto isso, o “jovem em situação de vulnerabilidade ou risco social incluído no Requip” não terá vínculo de emprego com o estabelecimento, não terá direitos trabalhistas e previdenciários, não terá salário, não terá proteção social, mas será “contabilizado para efeito de cumprimento da cota obrigatória de aprendizagem”.

No Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtiva – REQUIP, a contratação do jovem se dará por meio de Termo de Compromisso de Inclusão Produtiva – CIP (art. 43, §1º, I, do PLV da MPV 1.045, de 2021) e a remuneração será por Bônus de Inclusão Produtiva – BIP e Bolsa de Incentivo à Qualificação – BIQ (art. 43, §1º, II e III, do PLV da MPV 1045, de 2021). Há previsão de seguro de acidentes pessoais (artigo 67 do PLV da MPV 1045, de 2021), recesso de 30 dias com metade da remuneração (artigo 68 do PLV da MPV 1045, de 2021), adesão facultativa ao Regime Geral de Previdência Social (artigo 71 do PLV da MPV 1045, de 2021), encerramento do CIP a qualquer tempo (artigo 73 do PLV da MPV 1045, de 2021) e impossibilidade de participação em negociações coletivas (Parágrafo único do artigo 78 do PLV da MPV 1045, de 2021). Além disso, a qualificação profissional teórica prevista no REQUIP possui carga horária de apenas 180 horas por ano (artigo 58 do PLV da MPV 1045, de 2021), muito inferior à da Aprendizagem Profissional, que é de no mínimo 400 horas, e não será remunerada (artigo 57 do PLV da MPV 1045, de 2021).

Como visto, o artigo 66 é ostensivamente preconceituoso, elitista, excludente e discriminatório, considerando as pessoas em situação de vulnerabilidade ou risco social como uma categoria inferior de pessoas, de quem podem ser retirados os direitos trabalhistas e previdenciários por meio de um programa que incentiva sua contratação precária para a substituição da cota de aprendizes contratados pelas regras celetistas. Assim, as pessoas que mais precisam da proteção do Estado, que têm mais dificuldade de inclusão no mercado de trabalho, que mais precisam de oportunidades dignas de emprego, serão as mais prejudicadas, porque deixarão de ser contratadas como aprendizes para serem contratadas como beneficiárias do REQUIP. Não haverá mais aprendizes com deficiência, aprendizes beneficiários do bolsa família,aprendizes em situação de acolhimento institucional, pois os direitos trabalhistas e previdenciários lhes serão negados pelo estímulo nefasto à sua contratação pelo REQUIP, na mais absoluta afronta ao artigo 3º, inciso IV, da CR, de 1988, e ao artigo 3º, alíneas “b” e “e” da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, bem como ao artigo 7º da CR, de 1988.

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
- garantir o desenvolvimento nacional;
- erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
- promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

REQUIP

Além do disposto no artigo 66 em relação à Aprendizagem Profissional, sob o pretexto de “oferecer proteção social e segurança alimentar ao trabalhador pertencente a família de baixa renda” e“garantir qualificação profissional e inclusão produtiva do jovem no mercado de trabalho” (artigo 43, incisos I e II do PLV da MPV 1045, de 2021), a Medida Provisória pretende, de forma expressa (artigo 78 do PLV da MPV 1045, de 2021), criar uma classe de trabalhadores sem direitos trabalhistas e previdenciários, os denominados beneficiários do REQUIP, ferindo o Estado Democrático de Direito, aviltando a dignidade da pessoa humana e desprezando os valores sociais do trabalho (artigo 1º, incisos III e IV, da CR de 1988).

CR de 1988

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

...

  • - a dignidade da pessoa humana;

  • - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;


PLV da MPV 1045, de 2021

Art. 78. Não se aplica a Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1943, ou quaisquer outros dispositivos da legislação trabalhista ao Requip.

Parágrafo único. Os beneficiários do Requip não constituem categoria profissional e, portanto, os dispositivos do Termo de Compromisso de Inclusão Produtiva não serão objeto de negociação coletiva, ficando o ofertante autorizado a oferecer liberalidades e condições mais favoráveis ao beneficiário.

Disfarçado de programa temporário de trabalho e qualificação profissional, o REQUIP é uma precarização da política pública da Aprendizagem Profissional, mas com o risco real e iminente de que venha a substituí- la. As semelhanças nas estruturas dos dois programas não deixam dúvidas de que se trata de mais uma tentativa de redução de custos das empresas às custas da diminuição da qualidade e da efetividade do direito à profissionalização de adolescentes, jovens e pessoas com deficiência.

Os dois programas preconizam a qualificação profissional dos jovens, priorizam a participação de entidades formadoras, trazem previsão de cadastro de entidades, fazem referências a cota, base de cálculo, jornada de trabalho parcial, atividades teóricas e práticas, certificado de qualificação profissional, vedação de trabalho perigoso e insalubre, dentre outras semelhanças.

Porém, no REQUIP a carga horária teórica é bastante reduzida e não remunerada, pois não integra a jornada global do Termo de Compromisso de Inclusão Produtiva (art. 57, II, do PLV da MPV 1045, de 2021). Também não há regras para garantia da qualidade mínima dos cursos, não há relação do curso com as atividades práticas, bem como não há qualquer vinculação com os cursos técnicos aprovados pelo MEC, não há regramentos específicos para a oferta de cursos na modalidade à distância.

A possibilidade de participação das Entidades sem fins lucrativos no REQUIP ficou bem restrita, com atuação apenas subsidiária, e seleção e remuneração advindas dos Serviços Nacionais de Aprendizagem. Além disso, foram incluídas outras entidades no rol de entidades qualificadas em formação técnico- profissional (artigo 60, do PLV da MPV 1045, de 2021) e há também a possibilidade de a própria empresa oferecer a formação inicial e continuada ou qualificação profissional (artigo 65, do PLV da MPV 1045, de 2021).

PLV da MPV 1045, de 2021

Art. 60. Consideram-se entidades qualificadas em formação técnico-profissional, aptas a oferecer a qualificação teórica e prática prevista nesta Lei:

...

  • subsidiariamente, as entidades sem fins lucrativos que tenham por objetivos a assistência ao adolescente e ao jovem e a educação profissional, nos termos de ato do Ministério da Economia.


...

Art. 65. A formação inicial e continuada ou qualificação profissional de que trata o art. 58 desta Lei poderá ser oferecida diretamente pelo ofertante do Termo de Compromisso de Inclusão Produtiva, por meio de unidade de treinamento corporativo a ela vinculada, credenciada nos termos do art. 62 desta Lei, hipótese em que:

...

A abertura para a oferta de atividades teóricas por outras instituições formadoras e pelas empresas retira das entidades sem fins lucrativos espaço na política pública de qualificação profissional, conquistado pelo trabalho de excelência que vem sendo realizado desde a Lei nº 10.097, de 2000, traduzido no bom atendimento às empresas e no compromisso com a formação profissional de qualidade dos adolescentes e jovens, e pessoas com deficiência.

Não é possível conceber que se busque atribuir essa tal subsidiariedade e retirar o espaço de atuação organizações da sociedade civil – entidades sem fins lucrativos, preterindo-as até mesmo diante de instituições privadas com fins lucrativos, como se observa da proposta. Impressiona tal pretensão, já verificada como tendência em outras iniciativas, e espera que seja veementemente rechaçada pelos Parlamentares, exatamente por se tratar daquelas organizações que possuem expertise para atuação com o público-alvo dos referidos programas e, ainda, não têm medido esforços para minimizar os impactos da pandemia de covid-19 na vida da população, inclusive desenvolvendo ações socioassistenciais, educativas e de segurança alimentar, na perspectiva da dignidade humana.

Redução de Potencial de Contratação de Aprendizes

É importante destacar que ordinariamente já são contratados como aprendizes adolescentes e jovens, em situação de vulnerabilidade ou risco social, e pessoas com deficiência. O artigo 66 da Medida Provisória reduzirá o potencial de contratação das empresas com a substituição dos contratos de aprendizes por termos de compromisso do Requip. As entidades sem fins lucrativos que atuam como entidades formadoras, nos termos do art. 430, II, da CLT, necessariamente devem ter dentre seus objetivos a assistência ao adolescente, além de possuírem registro no Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente. Tal fato, por lógica, já induz que a maioria dos adolescentes e jovens contratados como aprendizes se enquadrem em alguma situação de vulnerabilidade ou risco social.

Por fim, há ainda o temor de que seja ampliado o rol de pessoas em situação de vulnerabilidade por nova Emenda parlamentar, provocando uma redução ainda mais significativa no potencial de contratação de aprendizes.

Segue abaixo TABELA COMPARATIVA entre o REQUIP e a Aprendizagem Profissional demonstrando as semelhanças entre os programas e grave precarização das relações de trabalho introduzidas pelo novo programa:








Pedidos

Diante do exposto solicitamos aos dignos representante populares integrantes do Parlamento:
Exclusão do Capítulo IV, que compreende os artigos 43 ao 80, relacionados ao REQUIP, do PLV da MP 1.045/2021; ou
– Exclusão da palavra “subsidiariamente” do inciso V, do art. 60, do PLV da MP 1.045/2021, atribuindo condição igualitária de participação e oferta da formação técnico-profissional às entidades sem fins lucrativos; e
– Exclusão do art. 66 do PLV da MP 1.045/2021, que permite que trabalhadores contratados pelo REQUIP sejam contabilizados para efeito de cumprimento da cota de aprendizagem, uma vez que grande parte dos aprendizes atualmente contratados já são oriundos de famílias que vivenciam situações de vulnerabilidade ou risco social, inclusive beneficiárias de programas de transferência, razão pela qual o dispositivo apenas permitirá o rebaixamento da condição de contratação de aprendizes para o REQUIP de milhares de jovens, agravando ainda mais a sua condição.

Brasil, Bahia, 28 de julho de 2021.

ANA VIRGÍNIA FERNANDES ROCHA

Presidente – FETIPA-BA

Subscrevem o presente documento as seguintes instituições, fóruns, movimentos e conselhos:



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