21 de setembro de 2021 . 11:56
Jurisprudência sobre trabalho escravo ainda é conservadora, diz Daniela Muller
A juíza Daniela Valle da Rocha Muller lançou o livro “Representação judicial do trabalho escravo contemporâneo: compreendendo a construção da jurisprudência através da linguagem”, em live promovida pela AMATRA1, na sexta-feira (17). Com mediação da diretora da associação Áurea Sampaio, a autora conversou sobre a obra com a vice-presidente da Anamatra, Luciana Conforti, e com a desembargadora do TRT-1 Ana Maria Moraes. O evento foi transmitido nos canais da AMATRA1 no YouTube e no Facebook.
Daniela explicou que o livro, baseado em sua pesquisa de mestrado na UFRJ e lançado pela editora Lumen Juris, é resultado de sua trajetória atuante na área de Direitos Humanos, que é um dos pilares do Direito do Trabalho. Na obra, a magistrada analisa o discurso empregado em sentenças sobre as hipóteses em que se configura condição análoga à de escravizados.
“A jurisprudência sobre esse tema ainda é muito conservadora. Em 2003, houve uma mudança do artigo 149 do Código Penal, onde é previsto esse delito, com grande expectativa de que resultasse em menos impunidade, com punição mais efetiva de quem se beneficia da exploração. O artigo mudou radicalmente, mas a jurisprudência continuou quase a mesma”, afirmou.
De acordo com Daniela, a Justiça do Trabalho costuma adotar de forma mais ampla o conceito de trabalho escravo contemporâneo, englobando as circunstâncias além do cerceamento de liberdade, como servidão por dívida, retenção de documentos, situação degradante e jornadas absurdas. No entanto, pontuou que a jurisprudência retrógrada “acabou contaminando uma parte da Justiça do Trabalho, que passou a adotar essa visão mais restrita de que, se a pessoa não estiver trancada ou coagida, afastava-se a configuração de trabalho escravo”.
Luciana Conforti destacou haver forte resistência da jurisprudência em se considerar as modalidades de trabalho escravo contemporâneo que não sejam aquelas relacionadas à restrição de liberdade de locomoção do trabalhador. “Nossa legislação protege a dignidade do trabalhador e não só o seu direito de ir e vir. Isso já foi reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal, pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Tribunal Superior do Trabalho”, pontuou, afirmando que, muitas vezes, casos de trabalho degradante de jornadas exaustivas são entendidas como “infrações trabalhistas”.
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O fato é resultado do defeito de composição da sociedade brasileira, marcada pela escravidão e de medidas que, ao serem adotadas com a abolição, promoveram a exclusão das pessoas libertas, disse a vice-presidente da Anamatra. “A obra da Daniela analisa a imagem que os julgadores têm da escravização. Não é um problema de desconhecimento da lei ou falta de formação, mas um problema de não aceitação de que aquelas modalidades de escravização que não são restritas à retenção da liberdade do trabalhador sejam consideradas como crime. Há uma rejeição ao conceito legal já reconhecido pelos tribunais superiores.”
A autora do livro ainda ressaltou a necessidade de desvincular o trabalho escravo contemporâneo às imagens de filmes e novelas sobre escravidão do século 18 e 19, em que as vítimas aparecem amarradas com correntes, por exemplo. “O que vivemos hoje em dia está ligado às formas atuais de produzir, muitas vezes relacionadas a atividades consideradas mais avançadas e tecnológicas”, afirmou.
As informações apresentadas por Daniela e Luciana sobre a jurisprudência a respeito do trabalho escravo impactaram a desembargadora Ana Maria Moraes, diretora do Centro Cultural do TRT-1. “Falta muita empatia. Lamento que juízes pensem dessa forma. Não estou criticando juridicamente os magistrados, mas é preciso se colocar no lugar do outro”, afirmou.
A desembargadora também exaltou a atuação da juíza no combate à prática ilegal. Foi por meio de um convite de Ana Maria que Daniela Muller passou a integrar a Comissão de Enfrentamento ao Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas do TRT-1 e acompanhar a temática mais de perto.
“Além de ser uma excelente juíza, é muito corajosa e firme. Isso é preciso, para se enfrentar uma situação como a do trabalho escravo, que também abrange o trabalho infantil. Essa é uma realidade com a qual convivemos todos os dias, mas, ainda bem, temos pessoas como a Daniela, que abraça essa causa.”
Para Áurea Sampaio, a leitura do livro promove a reflexão sobre o motivo de a sociedade ter naturalizado e tolerado, até os dias atuais, situações degradantes de trabalho, como é tratado no documentário “Precisão”, exibido antes do debate. “O que se vê sempre no trabalho escravo é que o trabalhador é libertado, mas depois retorna e é encontrado novamente em outras fiscalizações, submetidas às mesmas condições de trabalho anteriores. No documentário, eles falam exatamente que retornam porque a ‘precisão’ os obriga”, afirmou.
“Representação judicial do trabalho escravo contemporâneo” está em promoção no site da editora Lumen Juris. Até o dia 24 de setembro de 2021, os interessados que usarem o código “AMATRA1” no ato da compra vão ganhar 30% de desconto e frete grátis.
Veja o lançamento do livro na íntegra:
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Daniela explicou que o livro, baseado em sua pesquisa de mestrado na UFRJ e lançado pela editora Lumen Juris, é resultado de sua trajetória atuante na área de Direitos Humanos, que é um dos pilares do Direito do Trabalho. Na obra, a magistrada analisa o discurso empregado em sentenças sobre as hipóteses em que se configura condição análoga à de escravizados.
“A jurisprudência sobre esse tema ainda é muito conservadora. Em 2003, houve uma mudança do artigo 149 do Código Penal, onde é previsto esse delito, com grande expectativa de que resultasse em menos impunidade, com punição mais efetiva de quem se beneficia da exploração. O artigo mudou radicalmente, mas a jurisprudência continuou quase a mesma”, afirmou.
De acordo com Daniela, a Justiça do Trabalho costuma adotar de forma mais ampla o conceito de trabalho escravo contemporâneo, englobando as circunstâncias além do cerceamento de liberdade, como servidão por dívida, retenção de documentos, situação degradante e jornadas absurdas. No entanto, pontuou que a jurisprudência retrógrada “acabou contaminando uma parte da Justiça do Trabalho, que passou a adotar essa visão mais restrita de que, se a pessoa não estiver trancada ou coagida, afastava-se a configuração de trabalho escravo”.
Luciana Conforti destacou haver forte resistência da jurisprudência em se considerar as modalidades de trabalho escravo contemporâneo que não sejam aquelas relacionadas à restrição de liberdade de locomoção do trabalhador. “Nossa legislação protege a dignidade do trabalhador e não só o seu direito de ir e vir. Isso já foi reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal, pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Tribunal Superior do Trabalho”, pontuou, afirmando que, muitas vezes, casos de trabalho degradante de jornadas exaustivas são entendidas como “infrações trabalhistas”.
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A autora do livro ainda ressaltou a necessidade de desvincular o trabalho escravo contemporâneo às imagens de filmes e novelas sobre escravidão do século 18 e 19, em que as vítimas aparecem amarradas com correntes, por exemplo. “O que vivemos hoje em dia está ligado às formas atuais de produzir, muitas vezes relacionadas a atividades consideradas mais avançadas e tecnológicas”, afirmou.
As informações apresentadas por Daniela e Luciana sobre a jurisprudência a respeito do trabalho escravo impactaram a desembargadora Ana Maria Moraes, diretora do Centro Cultural do TRT-1. “Falta muita empatia. Lamento que juízes pensem dessa forma. Não estou criticando juridicamente os magistrados, mas é preciso se colocar no lugar do outro”, afirmou.
A desembargadora também exaltou a atuação da juíza no combate à prática ilegal. Foi por meio de um convite de Ana Maria que Daniela Muller passou a integrar a Comissão de Enfrentamento ao Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas do TRT-1 e acompanhar a temática mais de perto.
“Além de ser uma excelente juíza, é muito corajosa e firme. Isso é preciso, para se enfrentar uma situação como a do trabalho escravo, que também abrange o trabalho infantil. Essa é uma realidade com a qual convivemos todos os dias, mas, ainda bem, temos pessoas como a Daniela, que abraça essa causa.”
Para Áurea Sampaio, a leitura do livro promove a reflexão sobre o motivo de a sociedade ter naturalizado e tolerado, até os dias atuais, situações degradantes de trabalho, como é tratado no documentário “Precisão”, exibido antes do debate. “O que se vê sempre no trabalho escravo é que o trabalhador é libertado, mas depois retorna e é encontrado novamente em outras fiscalizações, submetidas às mesmas condições de trabalho anteriores. No documentário, eles falam exatamente que retornam porque a ‘precisão’ os obriga”, afirmou.
“Representação judicial do trabalho escravo contemporâneo” está em promoção no site da editora Lumen Juris. Até o dia 24 de setembro de 2021, os interessados que usarem o código “AMATRA1” no ato da compra vão ganhar 30% de desconto e frete grátis.
Veja o lançamento do livro na íntegra:
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