19 de agosto de 2021 . 13:11

Programas da MP 1.045 promovem discriminação, diz juíza à Rádio Nacional

Em entrevista à Rádio Nacional nesta quarta-feira (18), a 2ª vice-presidente da AMATRA1, Adriana Leandro, afirmou que os programas de emprego criados pela Medida Provisória 1.045/2021 - Requip (Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtiva), Priore (Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego) e Programa Nacional de Prestação de Serviço Voluntário - são discriminatórios contra a população vulnerável. Na conversa, que durou 26 minutos, a magistrada também tratou dos prejuízos que os projetos poderão causar para a aprendizagem profissional, política pública eficiente para a inserção de adolescentes e jovens no mercado de trabalho. O texto da MP foi aprovado pela Câmara dos Deputados na quinta-feira (12) e, agora, segue para apreciação do Senado Federal.

“A medida cria subclasses de trabalhadores que serão estigmatizadas. A grande população vulnerável é negra e, mais uma vez, será marginalizada. Teremos, por exemplo, dentro de uma empresa, um auxiliar de serviços gerais ganhando mil reais e outro, com uma carga horária duas horas menor, ganhando 400. Isso é discriminatório e interfere nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da valorização social do trabalho, que indicam que o trabalho deve ser respeitado e tratado de maneira igual”, disse, no programa Tarde Nacional, a juíza que também é coordenadora do Acordo de Cooperação para o Combate ao Trabalho Infantil no Estado do Rio de Janeiro e gestora de 1º grau do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem do TRT-1.

Adriana relembrou que, inicialmente, a MP 1.045 tinha como finalidade regular o trabalho no cenário da pandemia da Covid-19, trazendo o benefício emergencial concedido a trabalhadores empregados e informais. “Mas o projeto de lei de conversão da medida provisória nos surpreendeu com matérias completamente estranhas à regulação da MP.”

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O resgate do Priore e do Requip e a proposta do programa nacional de voluntariado foram algumas das matérias que trouxeram grande preocupação às instituições e especialistas que atuam para proteger os direitos de jovens e adolescentes e promover o trabalho decente, indicou a magistrada. Ela destacou que as três modalidades de contratação, cujo público alvo são pessoas de 18 a 29 anos, têm características extremamente precarizantes. “Não há férias, 13º salário e previsão de carteira de trabalho assinada, e a remuneração é uma bolsa de cerca de 500 reais.”

A juíza ressaltou que a aprendizagem profissional, cuja cota já não vem sendo cumprida - são 40 mil vagas não preenchidas no Rio de Janeiro e 150 mil no Brasil -, serão prejudicadas pelos programas. Isso porque a intenção é destinar aos projetos parte do valor encaminhado pelo Sistema S (Sesi, Sesc, Senai e Senac) à política de aprendizagem. “A mudança poderá fazer com que haja maior facilidade de levar os jovens para o mundo do trabalho sem proteção legal, mesmo havendo vagas de aprendizes ociosas”, disse.

Também foi tratado por Adriana, na entrevista, a exclusão do artigo 66, que previa, para efeito de cumprimento da cota obrigatória de aprendiz, a contabilização dos jovens em situação de vulnerabilidade ou risco social contratados pelo Requip. Apesar do avanço, ela classifica como “muito grave” os efeitos que os programas ainda podem gerar aos jovens, já que, mesmo com o cumprimento da cota de aprendizagem, as companhias terão a possibilidade de contratar mais trabalhadores em condições precarizadas em vez de ampliar seu quadro de empregados protegidos pela CLT. 

“Pelo Requip, um jovem vai ganhar 440 reais, enquanto, pela aprendizagem, receberia o salário mínimo. Como aprendiz, o jovem é segurado da previdência social em caráter obrigatório; pelos programas do governo, poderá ser segurado facultativo, ou seja, vai ter que pagar para ter a cobertura do INSS. Na aprendizagem, a qualificação é de 400 horas de estudos e, nos programas, são de apenas 180 horas, sendo a grande maioria e à distância, o que é problemático em um país ainda sem inclusão digital”, indicou.

Para Adriana, é lamentável que uma MP que poderia incentivar empresas para a geração de empregos promova retrocesso social e precarização. “Isso trará ainda mais vulnerabilidade para quem já é vulnerável. São políticas que, no lugar de inserir e incluir, promovem o afastamento social.”

Ouça a entrevista na íntegra:

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