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Trabalho escravo ainda existe nas grandes cidades, diz Aline Leporaci

Trabalho escravo ainda existe nas grandes cidades, diz Aline Leporaci
O Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo é lembrado nesta terça-feira (28). A data é importante porque o trabalho em condições análogas às de escravizados ainda é uma realidade no Brasil. Em 2019, 1.054 trabalhadores foram encontrados nesta situação em todo o país, de acordo com o Radar da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia. 

Entre 1995 e 2018, mais de 53 mil trabalhadores foram resgatados e libertados, segundo o Observatório da Erradicação do Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas. No estado do Rio de Janeiro, foram 292 casos confirmados no mesmo período.

A política pública de erradicação do trabalho escravo brasileira tornou-se, no dizer a Organização Internacional do Trabalho (OIT), um exemplo a ser seguido na luta com o trabalho escravo, que é um compromisso internacional do Estado Brasileiro. No âmbito desta Política Pública, que se estrutura sobre a atuação do Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM) composto por auditores fiscais do trabalho, Polícia Federal, Ministério Público do Trabalho, e, mais recentemente, pela Defensoria Pública da União e pelo Ministério Público Federal, é de grande relevância o papel do juiz do Trabalho, a quem são levados os casos não solucionados extrajudicialmente. 

“Cabe ao juiz do Trabalho, quando não há termo de ajuste de conduta com o reconhecimento do vínculo empregatício e/ou rescisão indireta do contrato de trabalho de trabalhadores em condição análoga à de escravo, julgar as ações decorrentes da fiscalização empreendida pelo GEFM ou pelo MPT. Essa atuação do juiz do Trabalho é fundamental para contribuir para a efetivação do direito ao trabalho digno e a erradicação do trabalho escravo, quando verificados, no caso concreto, as características do trabalho escravo contemporâneo”, afirmou a desembargadora Carina Bicalho, diretora de Cidadania e Direitos Humanos da AMATRA1.

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A juíza do Trabalho Aline Maria de Azevedo Leporaci Lopes, associada da AMATRA1, ressaltou que a prática ilegal não é restrita à exploração no campo ou em cidades do interior.

“As pessoas devem ter consciência que o trabalho escravo ainda existe em qualquer lugar, até nas grandes cidades. Ter um dia de combate possibilita que a sociedade visualize e perceba que a prática ilegal está mais perto das grandes cidades do que se imagina. A reflexão sobre o tema é necessária para aumentar a visibilidade das hipóteses de trabalho escravo”, comentou a associada da AMATRA1.

Recentemente, a Justiça do Trabalho do Rio de Janeiro julgou o caso de um jovem estrangeiro empregado em uma pastelaria que sofreu ameaças e agressões, e era obrigado a pagar valores altos de aluguel, fazendo com que ele contraísse dívidas com o empregador. A sentença reconheceu a condição análoga à de escravo em razão das provas produzidas no processo, que está em segredo de justiça.

A juíza do Trabalho Patrícia Lampert destacou que o comércio é um dos setores que têm tido reincidência com práticas análogas à escravidão. “Atualmente, temos visto casos de trabalho escravo que envolvem o comércio, com cerceio da liberdade e jornadas extenuantes. Além disso, os casos ocorrem em áreas de maior vulnerabilidade nas cidades porque, em razão de custos e barreiras de linguagem, por exemplo, os trabalhadores ficam em situações mais vulneráveis a sofrer explorações”, disse.

Previsto no artigo 149 do Código Penal, o termo trabalho escravo é caracterizado pela presença dos aspectos jornadas exaustivas, condições degradantes, servidão por dívida e trabalho forçado. “Qualquer trabalho que exponha o trabalhador a condições extremas e extenuantes de serviço e o aliene de seus direitos pode ser considerado trabalho escravo”, explicou Aline.

Para a juíza Patrícia, a prática de trabalho escravo invisibiliza os trabalhadores, que precisam de apoio legal para conseguir superar o problema. “A lei tenta evitar que a situação se repita, garante os direitos que os trabalhadores têm e auxilia o trabalhador a retomar a dignidade e a cidadania porque ele fica em situação de total vulnerabilidade, sem direitos. O trabalhador escravizado que é resgatado ganha esperança novamente e passa a ser enxergado, é inserido novamente na sociedade”, afirmou.

“Infelizmente, os avanços já experimentados pelo Brasil com vistas à erradicação do trabalho escravo precisam ser vigiados, pois essa política pública pode sofrer ataques orçamentários que inviabilizem ou escasseiem as operações de fiscalização conjuntas e a fiscalização de denúncias trazidas por diversos atores sociais, como a Comissão Pastoral da Terra”, acrescentou a desembargadora Carina Bicalho.

O Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo foi criado em homenagem a uma equipe de auditores fiscais assassinada em 2004, em Unaí (MG). Os auditores Nélson José da Silva, João Batista Soares Lage e Eratóstenes de Almeida Gonçalves e o motorista Aílton Pereira de Oliveira foram mortos durante fiscalização que apurava uma denúncia de trabalho em condições análogas às de escravizados em uma fazenda da cidade. O episódio ficou conhecido como "a chacina de Unaí". Os dois executores do crime estão presos, mas os mandantes respondem em liberdade.

*Foto: Agência Brasil
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