16 de agosto de 2022 . 10:24

Justiça anula dispensa discriminatória de médica com transtorno bipolar

Por considerar a dispensa discriminatória, a 3ª Turma do TRT-4 (RS) decidiu anular a rescisão de contrato de trabalho de uma médica diagnosticada com Transtorno Afetivo Bipolar com uma operadora de plano de saúde. Os desembargadores seguiram o voto do relator, Clóvis Fernando Schuch Santos, que reformou a sentença do primeiro grau, determinando a condenação da ré ao pagamento das verbas trabalhistas devidas e de R$ 25 mil a título de indenização por danos morais.

A médica procurou a Justiça do Trabalho para pedir a nulidade do acordo rescisório celebrado com a ré, além da reintegração ao emprego, com o pagamento dos consectários legais e de indenização por danos morais. Na inicial, ela relatou que, sete anos após ser contratada, passou a ter crises em razão do Transtorno Afetivo Bipolar, tendo, em outubro e novembro de 2018, um episódio depressivo bipolar grave. Devido aos efeitos colaterais de um “potente esquema farmacológico” necessário para o tratamento – como sonolências e lapsos de memória – foi perseguida pelo diretor administrativo.

De acordo com a trabalhadora, a demissão foi informada em dezembro do mesmo ano. No ato da dispensa, o RH entregou, para sua assinatura, papéis que ela acreditava ser a comunicação da dispensa, mas se tratavam de um acordo segundo o artigo 484-A da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). A médica afirmou, na ação, ter se sentido “usada, enganada e descartada” em um momento de fragilidade, por ter sido “induzida a assinar um acordo, de forma a tentar conferir aparente legalidade a uma despedida discriminatória em razão dos transtornos psiquiátricos”. 

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No primeiro grau, o juízo negou o pedido da médica. Para o magistrado, não ficou comprovado que a autora não assinou o acordo por vontade própria, e não há provas do quadro de saúde alegado no momento da rescisão. Além disso, o juiz declarou que, para configurar dispensa discriminatória, a doença deve ser grave e causar estigma ou preconceito – o que não seria o caso da depressão.


Na análise do recurso da trabalhadora, o relator, Clóvis Fernando Schuch Santos, discordou da aplicação da legislação empregada ao caso concreto, que trata apenas da depressão pura e simples, e não do transtorno bipolar. “Esta doença alterna episódios de depressão com os de mania. Logo, trata-se de uma condição muito mais complexa do que a depressão desacompanhada da bipolaridade”, afirmou o desembargador, destacando não ser novidade “que o transtorno bipolar cause estigma”.

O magistrado pontuou que a psicofobia, ou seja, o preconceito contra as pessoas que têm transtornos e deficiências mentais, pioram o quadro de saúde das pessoas com essas condições, e que a ré, militante na área da saúde, deveria zelar para que não houvesse piora do estado emocional e psicológico de sua empregada.

“A prova dos autos me convence que sim, eles tinham conhecimento dessa situação, mas ao invés de auxiliar na recuperação da trabalhadora, usaram esses sintomas para se desvencilhar da parte autora com mais facilidade, inclusive com substancial economia no valor das verbas rescisórias pagas”, afirmou, no voto.

Dessa forma, além dos R$ 25 mil de indenização por danos morais, Santos determinou que a empresa pague os salários devidos desde a despedida até a data em que a parte autora iniciou em novo emprego, assim como as diferenças de aviso prévio e multa de 40% do FGTS. O desembargador também ordenou que a ré retifique a CTPS (Carteira de Trabalho e Previdência Social) da trabalhadora, para constar a totalidade do aviso prévio proporcional.

Número do processo: 0020207-06.2019.5.04.0232. Clique aqui para ler na íntegra.

*Foto: TRT-4 < VOLTAR