02 de setembro de 2019 . 14:29

Estudo diz que cotas no curso de Direito da UERJ ajudam a reduzir a desigualdade

Em coluna publicada no jornal O Globo nesta segunda-feira (2), o jornalista Antônio Gois afirmou que o sistema de cotas adotado pela UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) desde 2002 tem contribuído para a redução da desigualdade. Um estudo comprovou que a política de ação afirmativa beneficiou os mais pobres sem afetar os demais estudantes do curso de Direito.

“As cotas, sozinhas, não vão resolver o problema. Mas as evidências mais rigorosas até o momento apontam que seus benefícios têm superado efeitos colaterais temidos no momento de sua implementação”, afirmou Gois.

A análise da dissertação de mestrado “Os efeitos de ação afirmativa: evidências do curso de Direito da UERJ”, escrita por Ana Carolina Trindade Ribeiro, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP (Universidade de São Paulo), faz uma correlação entre a lista de aprovados e não-aprovados, por cotas ou pelo sistema tradicional, no vestibular entre 2006 e 2010 e a lista de aprovados no exame da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) entre 2010 e 2015.

Leia o artigo na íntegra:

Quando a Uerj implementou sua política de cotas, em 2002, parte dos especialistas expressou uma preocupação, legítima, sobre o que aconteceria com os alunos beneficiados pelo sistema, especialmente em cursos de maior prestígio. Havia o temor de que as taxas de evasão e o desempenho acadêmico desse grupo fossem muito piores em relação aos demais, o que, felizmente, não se confirmou. 

Um novo estudo, apresentado na sexta-feira passada na 10a reunião da Associação Brasileira de Avaliação Educacional, avança ainda mais no diagnóstico dessa política pública ao identificar o que aconteceu depois da formatura com cotistas e não-cotistas da Uerj na área de Direito. A boa notícia que trazem os dados analisados por Ana Trindade Ribeiro (Stanford) e Fernanda Estevan (FGV-SP) foi que o sistema fez uma diferença brutal em favor dos jovens beneficiados, sem prejudicar aqueles que, por não serem elegíveis ao benefício, acabaram não entrando na Uerj.

Para chegar a essa conclusão, as pesquisadoras analisaram, pelos dados do Departamento de Seleção Acadêmica da Uerj, a lista de aprovados e não-aprovados, por cotas ou pelo sistema tradicional em Direito, no vestibular da instituição, entre 2006 e 2010. Essas informações sobre o desempenho de milhares de candidatos no período foram depois comparadas com as listas de aprovados no rigoroso exame da OAB entre 2010 e 2015, requisito para exercer a advocacia.

Ao analisar essas informações relativas a milhares de jovens nesse período, o estudo mostra que, para os cotistas, ter conseguido uma vaga na Uerj fez uma brutal diferença (da ordem de até 51 pontos percentuais) nas taxas de aprovação no exame da ordem em comparação com os candidatos que também eram elegíveis ao benefício, mas não foram aprovados na Uerj por uma pequena margem de desempenho. Já entre os não cotistas, a diferença entre os que passaram ou não ingressaram por pouco no curso de Direito da universidade é inexistente.

Uma das hipóteses para explicar esse resultado é que esses jovens, de maior nível socioeconômico, tiveram condições de compensar a reprovação no vestibular da Uerj ingressando em outros cursos que também deram a eles condições de serem competitivos no exame da OAB. Por isso, sua taxa de aprovação no exame da ordem não difere da verificada entre os alunos que, mesmo sem cotas, conseguiram a vaga na Uerj.

Ao comparar a aprovação na OAB entre cotistas e não-cotistas excluídos da Uerj por causa das cotas, o estudo identifica uma diferença de até 12 pontos percentuais na aprovação, em favor dos não cotistas. Ou seja, a política não elimina por completo a diferença observada entre esses dois grupos (ao menos quando medida pela aprovação na OAB), mas tem um impacto significativo na redução das desigualdades.

Agora que já temos as primeiras gerações de cotistas da Uerj e de outras universidades públicas que já estão no mercado de trabalho, é fundamental ter estudos como esse, que meçam o impacto da política de ação afirmativa em diferentes grupos no longo prazo. As cotas, sozinhas, não vão resolver o problema da desigualdade. Mas as evidências mais rigorosas até o momento apontam que seus benefícios têm superado efeitos colaterais temidos no momento de sua implementação.

*Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil < VOLTAR