10 de fevereiro de 2021 . 15:37

Cenário do Brasil no ano de eliminação do trabalho infantil é grave, diz Isa Oliveira

Para acelerar as medidas de combate à exploração do trabalho de crianças e adolescentes, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) declarou 2021 como o Ano Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil. O objetivo é convocar as nações a colocarem em prática ações efetivas para aumentar o combate e, assim, atingir a Meta 8.7 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU: acabar com o trabalho infantil em todas as suas formas, até 2025. No entanto, segundo Isa Oliveira, secretária-executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI), o governo brasileiro ainda não definiu estratégias e o país “vive um cenário extremamente grave”.

“O chamamento da ONU é aos estados nacionais, logo, aos governos, responsáveis por implementar as políticas públicas. Sem políticas públicas, não conseguimos acelerar o ritmo para a erradicação, nem eliminar e prevenir o trabalho infantil. Mas, até o momento, o estado brasileiro não se manifestou assumindo compromisso ou definindo ações e iniciativas que seriam adotadas no curso deste ano”, afirmou Isa, à AMATRA1.

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De acordo com dados da Organização Internacional do Trabalho (2016), 152 milhões de crianças entre 5 e 17 anos estão em situação de trabalho infantil no mundo, sendo 73 milhões em atividades de risco. Com a proximidade de 2025, ano limite para o cumprimento da meta, a resolução da ONU ressalta o compromisso dos Estados-membros na atuação para a redução do problema até sua total eliminação. 

Para isso, a OIT, em parceria com a Aliança 8.7, disponibilizou o cadastro de “Promessas de Ação 2021”, no site oficial do Ano Internacional. Até o dia 30 de março, países, organizações, empresas e cidadãos podem submeter seus compromissos de apoio à causa.

Nesta terça-feira (9), foi realizada a 1ª Reunião Ordinária do FNPETI em 2021, para avaliar as ações de impacto que podem ser adotadas pelo coletivo que atua na causa. Entre as instituições presentes, estavam representantes do FNPETI; da OIT; do MPT; da Comissão Nacional de Combate ao Trabalho Infantil e Estímulo à Aprendizagem, do Tribunal Superior do Trabalho (TST); e da Anamatra.

“Fizemos uma primeira discussão e inúmeras propostas foram apresentadas, mas ainda não concluímos porque as ações definidas devem ser executadas, por recomendação da OIT e da ONU, no ano de 2021. Com a dificuldade do distanciamento, que ainda permanece devido à pandemia, fica mais difícil articular. Nosso grupo de trabalho vai se reunir novamente em breve, para definir coletivamente o plano de ação a ser implementado”, afirmou Isa.

Ano Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil em meio à pandemia

O propósito do Ano Internacional ganha ainda mais relevância no contexto da pandemia da Covid-19, posterior à adoção da resolução, destacou Isa Oliveira, já que diversas ocorrências colocaram em risco a redução do trabalho infantil e podem motivar o aumento do problema.

“No caso do Brasil, já estava em curso a aceleração da desigualdade social, que vinha se manifestando através de altas taxas de desemprego, de informalidade, de perda de renda das famílias mais vulneráveis, que são as que têm crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil. Se soma a esse agravamento, a desestruturação das políticas públicas e a redução de investimentos, especialmente nas políticas de proteção social”, disse.

O fechamento das escolas para garantir a segurança e a saúde durante a crise sanitária também pode agravar a questão da exploração do trabalho desta parcela da população. “As crianças são inseridas no mercado de trabalho na informalidade, na mendicância, na venda de produtos no comércio ambulante por estarem afastadas das escolas e pela perda muito grande de renda das famílias.”

Obstáculos do Brasil no combate ao trabalho infantil

Entre as dificuldades que o Brasil enfrenta para superar o trabalho infantil, estão a pobreza, o racismo estrutural e a naturalização do problema - que são também causas desse tipo de exploração, como ressaltou Isa Oliveira. 

“É errada a compreensão de que o trabalho infantil é bom, que forma caráter e é solução. Na verdade, todos os estudos e a realidade nos mostram que o trabalho infantil não é solução, mas um determinador da reprodução da pobreza. Se essa questão fosse positiva e importante para a infância e a adolescência, seria um privilégio das crianças ricas.”

Isa também alerta para a desestruturação das políticas públicas que dificulta a atuação brasileira contra a questão. A extinção da Comissão Nacional para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (CNODS), que acompanhava o cumprimento dos ODS da Agenda 2030, e as alterações na Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil (CONAETI) também dificultam a comunicação em prol do desenvolvimento saudável de crianças e adolescentes.

“Houve um fechamento de espaços de diálogo. A luta contra o trabalho infantil exige articulação entre o poder público e a sociedade civil organizada, e a implementação de políticas públicas nas áreas de educação, saúde, cultura, trabalho e proteção social, com recursos suficientes”, disse Isa.

Todos podem ajudar a causa

Para a secretária-executiva do FNPETI, a meta de eliminação do trabalho infantil até 2025 é difícil de ser alcançada, tendo em vista que a luta pela erradicação da prática não é inserida como prioridade nas pautas governamentais. 

Porém, é possível que cada um contribua com a causa no dia a dia, em qualquer ano, reforçando a conscientização da sociedade e alertando sobre as consequências do problema.

“Precisamos convencer as pessoas a enxergarem o trabalho infantil. O problema está às vistas: passamos por crianças nos semáforos, na porta de supermercados, nas praias. São fundamentais o reconhecimento e a não aceitação. Essa violação de direitos humanos de crianças e adolescentes traz uma série de prejuízos que repercutem na vida dos envolvidos. É preciso que as pessoas entendam a gravidade da situação. Crianças e adolescentes são sujeitos de direitos, e precisam ter o direito à prioridade da educação no sentido amplo, de qualidade e inclusiva, ofertada pelo estado”, afirmou Isa. 

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Foto: Valter Campanato/Agência Brasil < VOLTAR